Boa sorte, meu amor, Doméstica, Eles voltam, Era uma vez eu, Verônica, Febre do rato, O som ao redor... Qualquer interessado em cinema deve ter visto pelo menos um dos longas-metragens citados. Em comum, todos eles foram filmados em Pernambuco, lançados na safra 2012-2013 e arrecadaram prêmios Brasil (e mundo) afora. Na atual temporada, três longas-metragens já se posicionam como possíveis destaques da cinematografia pernambucana: Amor, plástico e barulho, de Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira, Rio Doce-CDU, de Adelina Pontual e Tatuagem, de Hilton Lacerda. O primeiro, ainda em processo de finalização; o segundo, vitorioso na última edição do Cine PE; e o terceiro, com estreia garantida no Festival de Gramado. Os três percorrem o Grande Recife de uma ponta a outra. Pegam carona em ônibus. Passam pelo centro da cidade, passam por seus subúrbios. Observadores, os cineastas responsáveis por esses filmes (e itinerários) indicam qual faceta do Recife merece a sua atenção.
Mercado, bicicleta e frutos do mar
Leo Pyrata e Nash Laila em cena de Amor, plástico e barulho, ainda sem data de lançamento. Foto: Antônio Melcop/Divulgação |
Para Renata, a melhor maneira de se aproximar do Recife é se aventurando por seus mercados públicos. "É onde se entra em contato com as raízes culturais da cidade, com os produtos produzidos na região, do artesanato às comidas típicas. Mas se o turista quiser apreciar a paisagem dos nossos rio e mar, aconselho pegar uma bicicleta e fazer o trajeto Boa Viagem-Marco Zero, aos domingos". O programa preferido de Renata não muda. Sempre que volta de viagem, vai direto ao Império dos Camarões, restaurante especializado em frutos do mar, em Brasília Teimosa, vizinho à Boa Viagem. Depois dos comes e bebes, a dica é caminhar até o Parque de Esculturas Francisco Brennand, onde o pôr do sol é sempre mais bonito.
O Parque de Esculturas Francisco Brennand é um dos pontos turísticos preferidos de Renata Pinheiro. Foto: Júlio Jacobina/DP/D.A Press |
No último Cine PE – Festival do Audiovisual, o documentário Rio Doce-CDU, ainda sem data para entrar em cartaz, levou a estatueta de melhor edição de som e uma menção honrosa pela direção de fotografia. O filme de Adelina Pontual acompanha o percurso da linha de ônibus que vai do bairro de Rio Doce, em Olinda, até a Cidade Universitária, no Recife, como se fosse um passageiro. Um tanto mais atento, é verdade. "A ideia era fugir dos cartões-postais. Submergir nos seus subúrbios, nas suas ruas sujas, caóticas e mal cuidadas, mas sempre buscando apurar o olhar pra extrair a beleza do cotidiano, do banal. Paradoxos de uma cidade em transformação mesmo", explica. Serviram como locações os mercados da Madalena e da Encruzilhada, a aridez da Avenida Caxangá, o verde do campus da Cidade Universitária, todos esses pontos que a linha 920 contempla.
O documentário Rio Doce-CDU filma o percurso que a linha 920 faz diariamente. Foto: Cine PE/Divulgação |
Adelina não consegue dissociar a formação de seu olhar como cineasta de sua vivência no Recife. Já retratou a capital, por exemplo, sob outros ângulos, como no curta-metragem ReTrato (2012), em que o mês de julho, chuvoso e cinzento, dá a tônica da abordagem. "Adoro caminhar pelas ruas, descobrir atalhos. Pena que a cidade esteja tão mal cuidada", critica. Como cidadã, admira a arquitetura do Bairro do Recife, as areias da praia de Boa Viagem, o burburinho do Mercado de São José e a boemia do bar Central, no bairro de Santo Amaro. Mas é taxativa na hora de apontar um lugar em especial: o Santuário de Nossa Senhora da Conceição, no Morro da Conceição, um dos Altos da Zona Norte. "Me traz paz".
Santuário de Nossa Senhora da Conceição fica na Zona Norte do Recife. Foto: Juliana Leitão/DP/D.A Press |
Um brinde a Pierre Verger Roteirista de Amarelo manga (2002), Baixio das bestas (2007) e Febre do rato (2012), filmes dirigidos pelo amigo Cláudio Assis, Hilton Lacerda se prepara para lançar seu primeiro longa-metragem de ficção,Tatuagem. Diferentemente de Cartola – Música para os olhos (2006), documentário que dirigiu ao lado de Lírio Ferreira, em Tatuagem é o Recife o pano de fundo da narrativa. O Recife dos anos 1970, do desbunde dos artistas marginais, das relações afetivas entre as pessoas e a cidade. "O que mais me interessa mostrar no filme são lugares, do Recife, de Olinda e de Bonito que me despertam uma lembrança afetiva bastante forte. Uma memória manchada pela umidade, pela história e pelas experiências de pré-adolescência".
Tatuagem, primeiro longa-metragem de ficção de Hilton Lacerda, retrata o cotidiano dos artistas marginais do coletivo Chão de estrelas. Foto: Flávio Gusmão/Divulgação |
As lembranças urbanas de Hilton, ele diz, foram construídas pelos familiares, amigos e colegas que circularam e circulam com ele pelo Recife. "A melhor maneira de se conhecer a cidade é ter como cicerones pessoas circulantes, conhecedoras e bem-humoradas”. Interessado em um Grande Recife que não rima com praia de Boa Viagem nem com Alto da Sé, Hilton indica Brasília Teimosa, bairro popular fincado na orla da Zona Sul, como destino perfeito para o turista que quer fugir do óbvio. "É um lugar ao qual sempre me esforço pra levar os amigos. Existe ali um Recife diferente, com pessoas diferentes das que costumam ocupar o litoral do Brasil. Mistura cerveja, frutos do mar e um pouco de Pierre Verger", resume, citando o fotógrafo e pesquisador francês, que se dedicou a capturar imagens da cultura popular brasileira no século XX.
Fonte - Pernambuco.com Romero.Ricardo |